Crónica: Tupperwares na Expo 2000

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Cronistas da MulherPortuguesa
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Ainda se lembram na Expo 98? Certamente devem estar recordados, como eu estou, que a entrada de pessoas com alimentos era totalmente proibida.

Mais tarde, com tamanha insistência do nosso pacato povo e, nos recantos de uma mochila comprada propositadamente para a Expo, alojavam-se umas sandes de chouriço para enganar o estômago àvido de alimento. Mas, isto era em Portugal, Lisboa, o país dos falsos luxos e das ilusórias aparências.

Tupperwares na Expo 2000

Em Hannover, as coisas funcionam de outra maneira e os tupperwares e sandes, típicos da cultura portuguesa, mudaram-se para lá…

O povo português é muito dado a essas coisas de tupperwares e marmitas, ricamente confeccionadas e capaz de adoçar o apetite e o estômago a qualquer um.

É comum ir-se de viagem ou para outro sítio qualquer, e lá vai a companheira de estimação: a sandes de chouriço, Nobre ou do Alentejo, não interessa, desde que se assemelhe a chouriço.

Por vezes, é também muito frequente o tupperware, com os rissóis e pastéis de bacalhau, mais uma saladinha noutro caixinha daquelas e, uma peça de fruta, ou mais, porque somos pessoas de muito alimento e gostamos de comer bem. Que mal tem isso?

Em Lisboa, há dois anos atrás, tentou-se seguir este velho ritual, mas sem efeito algum, pelo menos no início. No recinto da Expo, não era permitido este tipo de vulgaridade, pois os turistas ficariam com má impressão nossa.

Um povo que constrói a Expo, da maneira emblemática que o fizemos, não pode comer umas sandes num dos muitos bancos que, por ali, ainda hoje persistem. Todavia, esta mania das grandezas lá foi sendo ultrapassada, aos poucos. Em Hannover, na Expo 2000, os portugueses que ali têm os seus restaurantes, julgavam que o cenáro iría ser igual. Mas, não é!

Como tive oportunidade de ler num diário matutino, as coisas por lá não estão no seu melhor. Os alemães limitam-se a seguir a tradição do tupperware, que por acaso até é nossa mas pronto, e deixam completamente às moscas os restaurantes portugueses.

Não há nada de mal no tupperware. Pessoalmente, julgo não ser nada negativo que na Expo de Lisboa, as pessoas pudessem levar umas sandes de casa. Claro que, devia haver limites, e não levar a cozinha, mesa e as cadeiras do campo atrás!

O próprio salário mínimo nacional não dá para muito mais, e nem toda a gente pode dar-se ao luxo de pagar uma ou mais notas, daquelas bem verdinhas, por uma refeição num daqueles restaurantes que se elevaram junto ao rio Tejo.

O que acabou por dar um sentido hilariante e de ironia entre a Expo 98 e a de 2000, foi a preocupação das entidades gestoras da Expo 98 não permitirem tamanha demonstração de pobreza e, agora, os alemães fazem sistematicamente esse mesmo gesto.

Ou será que Portugal está mais rico economicamente que a Alemanha e ninguém se tinha apercebido?

Já desde os tempos de Gil Vicente que havia este exagero de esconder a pobreza que deambulava pelas ruas, demonstrando um nível de vida que apenas correspondia a uma percentagem mínima da população. Hoje, passa-se a mesma coisa.

A Expo 98 terminou, mas os sintomas da grandeza mantêm-se em toda a parte. Em Hannover, comem-se sandes, e não há vergonha dos turistas que por eles passam.

Em Hannover, qualquer canto serve para deliciar a comida trazida de casa, pois não há estatística nenhuma que refira a diminuição de importância deste evento, apenas por trazer sandes de casa e tupperwares.

Lamento, que os comerciantes ali instalados não tenham o lucro esperado inicialmente. Lamento igualmente que, não possam ou não queiram apreciar as iguarias portuguesas.

Mas, lamento ainda mais que Portugal não tenha conseguido assumir a sua condição na Expo 1998. Porque, não há que ter vergonha de comer sandes ou comida em tupperware e, todos nos devemos consciencializar das nossas possibilidades, mesmo que sejam escassas.

Se calhar até o fazemos, individualmente e hipocritamente às escondidas, mas Portugal, enquanto país, é que nunca o foi, nem será jamais capaz de o fazer!

Cronista da Mulher Portuguesa: Ana Amante

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