Crónica: Ai que rica televisão!

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Cronistas da MulherPortuguesa
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É verdade, temos de levantar os braços aos céus e bradar a favor da nossa televisão. Graças a ela estamos a recuperar velhos hábitos há muito perdidos. Tempos houve em que o país parava face ao ecrã de televisão.

Ai que rica televisão!

Era o final da telenovela e queríamos saber com quem a Júlia casava, se a Gabriela se safava ou se o mauzão do Mauro tinha o castigo devido. Com o futebol era a mesma loucura, mas aí era a esperança de ver o Sporting chegar a campeão. No campo das notícias, havia sempre a esperança do anúncio de um aumento de ordenado.

Mas agora tudo mudou. O ecrã já não atrai. Deixamos mais vezes a casa, já não estamos acorrentados a um pequeno quadrado mágico. Os finais das novelas já são apresentados nas revistas, que até dão muito jeito porque trazem também umas gostosas notícias sobre as vidas dos famosos, uns conselhos do que devo e como devo fazer com o meu homem nas horas mortas do serão e até receitas de cozinha, que dão sempre um jeitão.

Quanto ao futebol, o Sporting já é campeão e até dá mais gozo ir ver o jogo para o café da esquina onde se pode insultar o árbitro em conjunto, sem correr o risco de levar com um pau na cabeça. E em relação às notícias, aumentos nem vê-los e já sabemos que é sempre o polícia que apanha do ladrão.

E os programas, senhoras, os programas. Digam-me lá que graça é tem ver uma casa, com uns quantos ‘maganos’ lá dentro? Então para isso olho para a minha e penso quando teria dinheiro para a pintar outra vez. E se não é uma casa é outra, com os tipos todos agarrados uns aos outros por correntes. Ora com o número de casamentos a diminuir por aqueles que não querem as amarras do matrimónio e pespegam-nos com isto.

Ou ainda com concursos nos intervalos da publicidade, sempre com gente muito nervosa, e perguntas com as respostas erradas pela própria produção. Ora adeus. Decidi e desliguei o aparelho.

E assim ficamos com mais tempo livre. Sem a televisão ligada, já todos comem e falam, lê-se, poupa-se energia que os tempos não estão para muitos gastos. E, sim, já sei o que está a pensar, mas diga lá que não é muito mais gostoso fazê-lo do que ficar apenas a ver?

Para disfarçar a cara feia da máquina, pus-lhe em cima um naperon onde descansam uns bonecos em cerâmica, oferta de amigos. E que bem que eles ficam ali. Além disso a superfície espelhada dá um óptimo espelho para quem não se quer ver como é.

Só ainda não tive coragem de fazer como uns amigos meus. Agarraram no televisor, tiraram-lhe todo o miolo e transformaram-no num aquário. Agora sentam-se na sala e olham para os peixes. Dizem que nunca a sua televisão passou tão boa programação.

Cronista da Mulher Portuguesa: Maria do Carmo Torres

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