Falta de Sarah Kane

3031
Falta de Sarah Kane
Falta de Sarah Kane

Estreia hoje a peça ‘Falta’ no espaço A Capital, levada a cena pelos Artistas Unidos. Um texto de Sarah Kane, com fortes influências de T. S. Elliot, e onde o irreal e a divagação têm o seu ponto máximo.

Falta de Sarah Kane

Após terem levado a cena a peça ‘Ruínas’, os Artistas Unidos relembram uma vez mais Sarah kane com ‘Falta’. Traduzida por Pedro Marques, ‘Falta’ acolhe de novo para a ribalta do Bairro Alto a escritora Sarah Kane, londrina, e que foi um marco na sua geração enquanto escritora.

Suicidando-se ainda jovem Sarah Kane, deixaria um espólio não muito amplo, mas intensamente rico no ponto de vista da escrita.

Uma peça demonstrativa dos sonhos destruídos de quatro jovens, das mágoas, tentações e desejos que um mundo desenfreadamente louco nem sempre deixa realizar. Este é o retrato que Sarah Kane idealizou num cenário que tem como ponto alto a guerra da ex-Jugoslávia de 1991 a 1995.

Brotam quatro vozes deste texto. Interligam-se entre si, fundem-se. Todas elas com uma sonoridade diferente, mas exactamente com o mesmo sentimento implícito.

No fundo, são quatro vozes que diferentes entre si traduzem a mesma realidade angustiante. Todo o texto é uma viagem alucinante a um mundo interior degradado, onde a ausência de muitos factores torna a essência da vida quase banal e desinteressante.

Precisam-se muitas coisas. O quê? Um incentivo, uma promessa, um amor, a paz, a ausência do medo, o desejo de um amanhã melhor. Personificam-se todos estes desejos em quatro pessoas: dois homens, um mais velho, outro mais novo, e duas mulheres, também uma delas mais velha que a outra, sendo esta última negra.

A diferença de idades não se transforma num abismo de interesses desencontrados. Não há nada que os diferencie na sua essência, nem raças, desejos, pecados ou sonhos.

Todos em busca de uma nova luz, um novo futuro, um novo mundo onde o passado regressa a cada instante. Mas, todos estes factores têm apenas como ponto de chegada uma realidade: o amor.

O amor nas suas mais variadas formas, o amor na sua concepção brutal, o amor na sua concepção platónica, o amor que é simplesmente o Amor.

O texto de Sarah Kane conserva em si os laivos de violência de outros escritos, mas debruça-se mais para uma veia poética que consegue apaziguar o efeito violento de outros textos. É notável a tentativa para um esfera denunciadora, mas sob outro local de encaixe: a poesia como forma de contar o íntimo de quatro pessoas.

Para lá das formas e contornos que a peça possa assumir, o seu todo trata de um retrato cruel e duro, embora verídico, dos sentimentos que a sociedade guarda dentro de si, mas que conserva religiosamente.

‘Falta’ é o nome da peça à qual pode assistir a partir de hoje no espaço A Capital. A homenagem aquela que foi uma figura emblemática da escrita londrina, pela mão do encenador Jorge Silva Melo, com interpretação de Cláudio da Silva, Isabel Munõz Cardoso, José Airosa e Sylvie Rocha.

Classificação
A sua opinião
[Total: 1 Média: 5]