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    Tradição da alimentação mediterrânica

    Alimentação mediterrânica
    Alimentação mediterrânica

    A alimentação mediterrânica traduz um conjunto de legados históricos e culturais que identificam e distinguem os seus territórios através de uma utilização criteriosa e hábil dos recursos que deles provêm, dando origem a um modelo alimentar de reconhecida actualidade e notoriedade.

    Nestes territórios, de austeras condições de produção agrícola, forjaram-se necessariamente tradições alimentares assentes na parcimónia dos recursos. Trata-se de uma herança de extrema frugalidade alimentar, que explica a sua identidade caracterizada pela parcimónia no consumo de alimentos de origem animal.

    E são precisamente essas heranças, essas memórias que são alvo, actualmente, de diferentes olhares, que vão no sentido de enaltecer este tipo de práticas alimentares antigas e de as reinterpretar à luz das novas tendências da cozinha contemporânea e das gastronomias modernas.

    Não só numa perspectiva de saúde pública mas também como um pilar de sustentabilidade social, ambiental e territorial. A grande actualidade das alimentações mediterrânicas, como modelos de saúde, constitui um tema complexo que não se resume ao enunciar dos benefícios dos produtos alimentares que lhes são inerentes.

    Ou seja nos territórios onde cresce o trigo, a vinha e a oliveira – com a sua já mítica trilogia: ”pão, vinho e azeite” – existem culturas onde as práticas alimentares tradicionais e os modos de vida em muito influenciam os níveis de saúde. O interesse por este tipo de alimentação iniciou-se a partir da segunda metade do séc. XX.

    Foram então promovidos diversos estudos epidemiológicos em populações da Europa do Sul, os quais visavam perceber as razões pelas quais a incidência de doenças cardiovasculares era muito menor nestas populações do que nos E.U.A e na Europa do Norte.

    A longevidade também era maior naqueles países, e o modelo alimentar de referência passou a ser o da ilha de Creta na Grécia. Por outro lado, como os hábitos alimentares de uma região correspondem, em geral, aos recursos locais em produtos da agricultura, da pesca e da pecuária, a alimentação tradicional destas regiões traduz as suas disponibilidades alimentares naturais.

    Ou seja, em terras de sequeiro e de parcos recursos, como são as que caracterizam estes territórios, as populações souberam “tirar partido” do que dispunham, com tal subtileza, que as diferentes tradições alimentares mediterrânicas são hoje reconhecidas na sua diversidade e complexidade, como modelos alimentares saudáveis. Todavia, os fundamentos deste modelo alimentar imbricam-se também na multiplicidade de factores que caracterizavam essa região, numa determinada época, isto é, a organização social e a ruralidade inerentes às práticas alimentares dos anos cinquenta-sessenta (época a que se reporta o inicio do reconhecimento dos benefícios deste modelo alimentar), são muito diferentes dos da actualidade.

    Nesta medida, é muito importante não confundir, pois nem todos os pratos da cozinha mediterrânica observam as recomendações dos cientistas, apenas os decorrentes de uma culinária simples, a dos pratos do dia-a-dia, da cozinha familiar rural. Isto tem sido muito frisado, mas, não tendo condições de o praticar porque inseridos no modo de vida urbano, corremos o risco de o esquecer, precisamente porque as preparações culinárias mais simples, menos prestigiadas socialmente e requerendo morosidade na sua preparação são as que têm tido menos visibilidade.

    As principais características desta alimentação centram-se num consumo muito reduzido de produtos de origem animal e na abundância do consumo de alimentos de origem vegetal. Destes, destacam-se os cereais − arroz e trigo − e os seus derivados − massas, cuscuz, pão. No interior deste grupo, o pão, integrando a já conhecida trilogia: “pão, vinho e azeite”, ocupa um lugar de destaque. Como referido anteriormente os produtos hortícolas – consumidas na época própria – ocupam um lugar de relevo neste tipo de alimentação, sendo ricos em nutrientes antioxidantes e em flavonóides, ambos protectores da saúde. De salientar que dos produtos hortícolas se destacam os de folhas verdes, as conhecidas verduras. Aliás, a sazonalidade dos produtos é um factor a salientar neste tipo de alimentação.

    Abundante é também o consumo de frutos, que são fornecedores de vitamina C, de carotenos e sais minerais. A principal fonte de proteínas é as leguminosas secas (grão, feijão, lentilhas…) as quais são também ricas em sais minerais e fibras alimentares solúveis. As gorduras utilizadas são sobretudo o azeite e a banha de porco, ambas ricas em ácidos gordos monoinsaturados. Os procedimentos de preparação culinária são simples sendo que a utilização de ervas aromáticas constitui também um aspecto identitário destas cozinhas da Europa do Sul, muitas vezes identificadas como cozinhas dos aromas.

    O consumo moderado de vinho (tinto, sobretudo) constitui igualmente um factor protector, que é característico deste tipo de alimentação. Enfim, como todos os modelos alimentares, este só poderá ser considerado saudável, quando inserido num conjunto de outras práticas de vida saudáveis, que privilegiem a ingestão regular de água e o exercício físico.

    Estas características foram traduzidas numa representação gráfica em forma de pirâmide, que serve para, num rápido olhar, visualizar a proporção do consumo adequado dos alimentos, para uma alimentação saudável.

    Revalorizar as cozinhas mediterrânicas subentende necessariamente equacionar a sua adequação às práticas de vida contemporâneas. Isto é, passa pela sua inovação mobilizando um conjunto de práticas e valores não funcionais, que terão de ser trabalhados, transmitidos e vivenciados. Isto porque se ao longo de milénios, a tão falada intemporalidade dos procedimentos que caracteriza as cozinhas mediterrânicas foi sendo transmitida através de práticas de socialização familiar, em que a passagem do testemunho culinário se fazia de mães para filhas.

    Actualmente esse veículo de transmissão encontra-se deficitário por via de outras práticas de socialização extra-familiar. Parece ser então indispensável conceptualizar uma aprendizagem ao nível do ensino formal.

    E não se trata só de saberes inerentes a procedimentos culinários, há toda uma identificação de produtos, ritmos de produção alimentar e recursos endógenos inerentes aos sabores mediterrânicos, que é necessário recuperar e transmitir. Neste sentido, abordar a inovação das alimentações mediterrânicas passa por questionar a salvaguarda do património imaterial (inerente aos saberes da oralidade), quando parte importante do seu suporte material, a qualidade intrínseca dos alimentos, está em declínio? Como conciliar o tempo necessário para a experimentação gastronómica, em torno de preparações culinárias laboriosas e demoradas, com o ritmo de vida actual?

    Como conciliar a pressa e a falta de tempo dos ritmos urbanos – que se verificam igualmente no mundo rural – com a atenção, a subtileza e o cuidado inerentes à preparação de certos pratos tradicionais, recriando as práticas de consumo mediterrânicas?

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