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Crónica: O Homo Consumus do Natal

Crónica: Natal virtual - o homo consumus
Crónica: Natal virtual - o Homo Consumus

Luzes, colorido, câmaras, acção… Não, não é bem isto mas anda lá perto. Vamos desta feita acompanhar mais um programa de David Vaitembora, (Herman José sem as resmas) que está a realizar um documentário acerca de uma nova raça que se tem vindo a desenvolver nos últimos anos em alguns países, o ‘homo consumus’.

Homo Consumus do Natal

E tal tem sido a ferocidade com que esta espécie se reproduz, que os Governos de muitos países tiveram de tomar medidas extremas para consignar o ‘homo consumus’ a pontos específicos e estratégicos.

Muito dinheiro tem sido gasto para evitar que esta praga alastre, mas por maiores espaços que se construam, nada parece resultar, antes pelo contrário, parecem apenas aumentar a fúria consumista, a principal e mais preocupante característica do ‘homo consumus’.

A melhor altura do ano para observar esta espécie é quando se aproxima uma das festas anuais comemoradas pela tribo, designada de Natal, supostamente uma festa religiosa, mas que, com a passagem dos anos e das tradições, viu relegado para segundo plano esse aspecto, dando lugar à fúria desenfreada desta espécie de recorrer a locais onde possam comprar sem limites.

Mas sigamos de perto este antropólogo e vamos observar as reacções da espécie.

São seres híbridos que parecem adaptar-se a todos os climas e condições, embora lhes agrade de sobremaneira viver em comunidades extensas e em recintos fechados onde se podem acotovelar e ter um contacto físico mais prolongado.” comenta David Vaitembora.

Está tudo preparado para mais um dia desta espécie e as nossas câmaras estão a postos. Foram ainda preparadas algumas armadilhas para observarmos as reacções destes animais.’ Cantam vozes angelicais e algo fanhosas que soam alto nos corredores dos hipermercados ou centros comerciais, habitat natural dos animais agora observados, enquanto afanosas formigas humanas entram de toca em toca (leia-se de loja em loja) para comprar aquele último presente. ‘Parece que a música funciona como um estimulante para levar o ‘homo consumus’ a integrar-se num ritmo que o levará a reagir perante as montras.

Estas são sabiamente organizadas para lhes captar a atenção, com chamarizes como luzes fortes, decorações vistosas e alusivas ao período que se vive e cartazes apelativos onde se promovem diversos produtos.’ É também muito importante discernir a forma de vida através dos meios usados para comunicar e os microfones estiveram a postos. ‘Vamos agora ouvir como se comunicam entre eles e qual o tipo de informação que nos podem passar através dos comentários que tecem enquanto afadigadamente se movimentam:’ – Oh, como a tia Gertrudes vai gostar daquela galinha de louça.

– Já comprei a camisola cor de laranja para o Pedro.
– Olha mãe, quero aquele jogo do Picachu, só custa 23 euros. Se não mo compras não gosto mais de ti.
– Tenho mesmo de comprar aquele conjunto que vi na ourivesaria e depois posso colocar a despesa na secção de ‘despesas de representação’ do IRS.

‘E agora altura para seguirmos até uma das armadilhas que montámos. Em locais estratégicos estão colocadas caixas de onde se retira a moeda de troca usada por este espécie. Resolvemos sabotar algumas e observar as reacções.’ A câmara foca um casal que se dirige para a máquina. Inserem o cartão plástico e nada acontece. Ele fica vermelho, ela começa a gritar, mas nada parece resultar. De comum acordo decidem dirigir-se para outra máquina e agora o alívio está estampado nos rostos.

Mais um indivíduo se dirige para a máquina, mas desta feita reage com alguma violência, mesmo sabendo (achamos nós) que se trata de um objecto inanimado. Duas fêmeas, ao deparar com a situação, resolvem dirigir a sua fúria para um dos seguranças, ali colocados estrategicamente pelas entidades que organizaram estes espaços, com vista a controlar alguns ímpetos menos correctos desta espécie, e colocam-lhe o problema o mais simpaticamente que esta espécie é capaz de fazer quando se encontra em situação de pressão.

Com vista a minorar os danos que o ‘homo consumus’ possa provocar fora do seu habitat natural, as entidades competentes determinaram também criar espaços onde este possa encontrar o seu alimento natural, e no mínimo espaço de tempo, situação que parece agradar-lhe sobremaneira.’ Outra característica interessante observada pelas câmaras é a capacidade de aprendizagem que as crias demonstram, sendo muitas vezes eles que guiam os pais para as tocas que mais lhes despertam a atenção e lhes indicam o que devem fazer.

‘E depois de um dia afadigado, em que a noite já cai, carregados de sacos e cabeceando de sono, estes exemplares de ‘homo consumus’ regressam às suas tocas, movimentando-se lentamente e em extensas filas, não perdendo contudo a cordialidade que mostraram todo o dia e apitando animadamente uns para os outros, dentro dos seus veículos.’ E assim termina mais este episódio da série em que pode observar os costumes mais bizarros do mundo.

Não perca o próximo episódio em que poderá conhecer melhorar a aterrorizante tribo que dedica o seu tempo a perseguir pequenos seres esféricos dentro de um campo, enquanto é apoiada pelos restantes membros da tribo.

Cronista da Mulher Portuguesa: Maria do Carmo Torres

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