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Querida amiga, mãe e mulher que perdeste o teu filho!

Querida amiga, mãe e mulher que perdeste o teu filho!

Triiimmmm! Triiiimmmm! “Está, mãe? Estou na bicha da ponte, vou para o trabalho. Estou a ouvir as notícias. Dizem que o Miguel Ganhão Pereira se suicidou. Parou o carro na ponte, ontem à noite e atirou-se ao rio!!!”

Querida mãe que perdeste o teu filho!

Meu Deus! O quê!? Como é possível? O que te levou a tal situação, querido Miguel! Que desespero não conseguiste vencer?

Como pudeste fazer isto? E a tua mãe?

Vejo-te ainda menino na messe de Nova Lisboa, no Huambo, onde vos conhecemos. A tua mãe, cujas gargalhadas inconfundíveis estalavam na sala de professores, no restaurante, em qualquer local, enchendo de alegria tudo à sua volta. Vejo-te a brincar com os meus filhos, apesar de ligeiramente mais velho quando nos visitávamos, e os bons petiscos que a tua mãe fazia. E aquela vez em que fomos todos comer uma sopa da pedra a Almeirim.

A alegria dos miúdos, que vocês eram, a conversa descontraída dos adultos. As férias em Vila Moura, as tardes quentes na piscina da casa dos teus tios e a indispensável sardinhada. Como se podia adivinhar que não estivesses a interiorizar que a vida é difícil, cheia de obstáculos, mas que vale a pena e é preciso nunca perder a esperança?

Não me recordo de ti excepcionalmente alegre, mas mais para o sério e responsável. Sinal amarelo de atenção. Os teus problemas com o Inglês fizeram com que viesses algumas vezes ter algumas explicações a minha casa e era notório que não tinhas queda especial para as línguas, o que sempre se notou durante o teu percurso profissional.

Continuares os estudos na universidade não era um objectivo imediato, mas tinhas aquela auto-confiança e interesse profundo por assuntos do quotidiano social, que provavelmente fizeram com que de repente tivesse a enorme surpresa de te ver no pequeno écran. Telefonei a dar-te os parabéns e terá sido talvez a última vez que falei contigo. Depois era sempre a tua mãe que atendia, pois a tua vida era agora agitada.

Fui acompanhando, à distância do sofá ao televisor, o teu aperfeiçoamento sistemático, a tua coragem em continuares num projecto televisivo tão atribulado, como tem sido o da TVI, soube que muitas vezes trabalhaste sem saberes se havia ordenado ao fim do mês. Mas mantiveste-te fiel, eficiente e durante um tempo foste o esteio visível da TVI! Sentia sempre uma pontinha de orgulho quando te via e a minha deformação profissional ia escrutinizando os teus progressos.

Houve uma altura que me pareceu notar no teu olhar algo que me preocupou, nem sei bem o quê. Os olhos revelam tanta coisa! Depois esse olhar mais carregado desapareceu e deu lugar a uma alegria e garridice, que aparecia especialmente quando introduzias as peças rápidas de passagens de moda mais atrevidas… e ficaste mais descontraído.

Descobri, numa revista, no cabeleireiro, que tinhas casado e lá vi a tua mãe e irmã e a tua pose de auto-confiança, quiçá encobrindo o ser introvertido que me parecias ser. Subitamente deixaste de aparecer no pequeno écran. Porquê? Novos ventos? Prateleiras injustas?

Querido Miguel, como foi que não conseguiste ultrapassar quaisquer que tenham sido os teus obstáculos? Não sabias que na vida tudo é um risco, que há muita inveja e traição, que os que hoje mandam e nos magoam amanhã já lá não estão ou em breve deixam de ter poder para isso? Que podemos reduzi-los a algo sem importância, para podermos saltar esses momentos?

Alguma doença incurável? Hoje há tantas descobertas científicas! Tu, que nos transmitiste tantas notícias de desgraça, de alegria, de dor, como não ganhaste “calo”? Sejam os problemas de ordem familiar ou profissional, ou de outra índole, NADA pode fazer-nos desistir. Não pensaste na tua mãe?

Se os homens soubessem o que custa dar vida a um ser, não tratariam a vida, a sua ou a dos outros, de forma tão ligeira. Carregar um ser durante 9 meses, sem saber como será, com todo o cuidado e pavor de fazer algo que o possa afectar, perguntar (verificar) com angústia, quando nasce, se é perfeito, para não ficarmos a carregar para sempre uma culpa, que nem culpa será….E vê-lo desaparecer… assim tão frio e calculado … ou tão dorido e magoado sem que ninguém se aperceba … é dor demais.

Todos temos momentos de desespero, mas é preciso encontrar a esperança!

“Oh filho, ele devia andar muito desesperado, para fazer tal coisa. Olha! Lembra-te que é preciso ter sempre muita esperança e acreditar que tudo se resolve, sabes? Faz boa viagem. Vai com muito cuidado” e que nada te aconteça, senão não suportaria a dor de te perder. Se fizesses uma coisa destas, dava-te uma valente sova, meu amor. Que horror! Nem pensar!

Pobre Miguel. Deus te dê a paz que perdeste momentâneamente. Deus ajude os teus familiares a superar esta dor insuportável! Querida amiga, mãe e mulher que perdeste o teu filho!

Dra. Manuela Freitas (CPCIL)

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